Corria o mês de Setembro de 73. O sol flagelava-nos o rosto, uma atmosfera quente
e húmida dificultava-nos a
respiração e a marcha. Deslocava-me em patrulha com o
meu Grupo de Combate, o Grupo Especial 214, integrado por soldados nativos.
Estávamos a cerca de 15 Km
a norte de Pundanhar em Cabo Delgado no norte de Moçambique.
Ao fundo a paisagem Tanzaniana exuberante e
assustadora para além do largo rio
Rovuma. Era um corredor de
infiltração de guerrilheiros da FRELIMO, vindos de
campos de treino na
Tanzânia. Foi também esta zona palco de escaramuças
entre
soldados portugueses e
alemães durante a 1ª Grande Guerra. É uma terra que
conhece a guerra, que tem marcas de guerra.
A nossa atenção virava-se para todos
os lados. Qualquer sinal, qualquer ruido
suspeito eriçava-me os
pelos, aumentava-nos a ansiedade, o medo. Teríamos sido
detectados pelos Frelos? Puxo por
um cigarro, o único antídoto contra a espera e o
enervamento.De súbito
salta-me à vista, colocado no cimo de uma árvore de
grande porte,
daquelas que ladeiam o rio, um
cortiço (de cortiça mesmo),fechado de ambas as
bandas e atado com sisal à
mais alta braça da árvore. Instintivamente apontei-lhe a
Valter. Medi a balística e
desisti do tiro. Acto contínuo saco a G3 ao Chitapata o
maconde, que estava a meu lado e
"rajadeio " o insólito objecto. Ainda a rajada não ia
a meio e já aquela merda
explodia para todos os lados... e eram granadas... e bazucas
e morteiros pelos ares. Quando dei por mim todos os homens estavam alapados ao
chão: -Xiiiii………… Siliva você vai matar a gente….
Quando o
ruído por fim terminou fui atingido na mona por uma
máquina de sulfatar
deformada, fumada e perfurada...uma obra de arte em latão que ainda hoje guardo
como recordação
daquele episódio, daqueles tempos, daquelas gentes, dos meus
soldados macuas e macondes.
Manuel Neves Silva ( ex-Furriel
Miliciano de armas pesadas )